sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Brasil - um país "para si" - em defesa do voto em Dilma em 2014.

Relendo Educação e Mudança, de Paulo Freire (1985), encontrei a crítica aos países periféricos que faziam-se "para os outros" (trabalhando, explorando seus recursos naturais, tendo a exportação como primeira meta) e não "para si", o que significaria colocar, em primeiro lugar, suas próprias necessidades. Na mesma semana (18-09) assisti o programa político do PT e fiquei muito feliz. Senti saudade do PT da década de 80 (tínhamos o mesmo discurso saudável, esperançoso e radical do PSOL e do PSTU) e estas mesmas ideias reaparecem no Programa de tv, de forma simples, fácil de entender: acreditar nas pessoas, providenciar que tenham as condições básicas de uma existência digna. O Programa deu-me uma percepção forte de que muito se preservou.
Em 19-09, no Facebook, cruzei com um texto que dizia uma enorme bobagem - por ignorância ou má fé, não importa - o que dizia é que na década de 80 o PT não tinha projeto, só tinha "uma única proposta, resumida em dois pontos comuns: não fazer alianças espúrias e não ceder às tentações do poder. Parece pouco; não é. " (David alguma coisa) Estou com 750 trabalhos atrasados, mas precisei parar para escrever. 
O PT, desde o seu surgimento, foi um partido com 3 correntes, os sindicalistas (de esquerda), os intelectuais comprometidos com uma visão de mundo de esquerda, e o pessoal da igreja católica, ligado as comunidades eclesiais de base, que tinha um vínculo forte com os movimentos sociais e que compartilhavam uma visão de esquerda.
Entender o que é esquerda aqui é muito importante, uma vez que é o que os unia e é o projeto do Partido (totalmente absurdo dizer que não tinha projeto, sempre teve um projeto e ele foi e é de esquerda):
O que é direita - existe uma política, que é majoritária, que acredita que quem trabalha direito, se esforça e cumpre suas obrigações terá uma vida digna e uma velhice segurada - é um modo de pensar muito fortemente ligado aos valores estadunidenses (liberdade = liberdade de subir na vida, assegurar seu quinhão e morrer tranquilo, porque a pobreza que lhe cerca é consequência da incompetência de pretos, pardos, vagabundos e pobres que não trabalham, não se esforçam e, portanto, não tem o mesmo direito que você; a competição é o meio de fazer com que as pessoas se esforcem e, com o esforço pessoal/individual de todos, a sociedade toda muda). Esta política, que o Bolsonaro, o Caiado, o Sartori e outros tantos verbalizam (também pensam que o casamento é um direito só dos heteros, um direito "para si", pois se enquadram no desenho que fizeram para si mesmos) é a política que predomina no mundo - é uma visão de direita - porque quer conservar o mundo como está, onde hoje 160 pessoas dirigem menos de 500 corporações que mandam/influem/destroem/definem a vida de todos os que moram no planeta. Um pouco mais da lógica desta política hegemônica pode ser vista no filme "A história das coisas -  disponível neste Blog. Ou, de forma mais densa no filme "Trabalho interno".
O que é esquerda - significa que você não acha justo quando uma pessoa nasce, trabalha desde os 16 anos, das 5h da manhã às 13h e das 15h às 20h (antes dos 16 anos, para quem nasceu na zona rural, como meu pai, e já trabalhava dando comida para os animais e na roça), e não tem direito a uma existência tranquila, com direitos básicos assegurados, aposentadoria digna. Ser de esquerda é ser contra o mundo injusto em que a gente vive; é ser contra as ideias liberais/neoliberais que defendem para os mais ricos e poderosos tudo e, para as pessoas comuns, o trabalho eterno e uma morte sem lembranças. Objetivamente, ser de esquerda é defender que um agricultor, um pequeno comerciante, uma professora pública, um médico, um vendedor ambulante, todos tenham direitos básicos assegurados, uma aposentadoria digna, um estado que funcione na defesa do bem estar de todos. Ser de esquerda e do PT significa defender um estado mais justo (porque tem esquerda que é contra o estado), dirigido com mais participação popular (daí os projetos de financiamento EXCLUSIVAMENTE PÚBLICO de campanhas políticas; o voto no Partido e não nas pessoas; a participação popular na definição do investimento do estado; o marco regulatório da imprensa, para não sermos tão manipulados).
O PT, a esquerda e a direita - o PT tentou chegar sozinho (reunindo-se apenas com partidos de esquerda) ao governo federal até a década de 90 e não conseguiu (até conseguiu em alguns municípios antes da década de 90 - em Porto Alegre em 89, por exemplo), então, diante de tantas tentativas sem sucesso na década de 90, o Lula apresentou a "carta aos brasileiros" (articulada pelo grupo do PT de São Paulo), reorientando a proposta de chegar ao governo, desta vez com uma aliança mais ampla. Este movimento representado pela "carta aos brasileiros" resultou em ter como vice o José Alencar (e as igrejas... e depois o Sarney, e boa parte - nem sempre a parte boa...rs... - do PMDB). Foi o jeito de sair dos eternos 30% (votos que o PT, junto com partidos de esquerda menores, conseguiam arrecadar) e chegar ao governo federal. A sociedade brasileira ainda é muito conservadora, vota com a direita ou com o coronel ou radialista da hora, que é da família de sempre. Chegar ao poder sem o apoio destes é algo que, ainda para o momento, parece impossível. Manter-se no poder também é impossível sem o apoio de parte conservadora da sociedade, mas que concorda que mais igualdade e justiça social é necessária. Chegar com apoio conservador significa já chegar bastante amarrado, parece óbvio, mas foi o jeito de chegar ao governo. Porém, foi também o jeito de implementar uma política social totalmente diferente do que faria o PSDB ou qualquer outro dos partidos que arrecadam muitos dos votos com os quais se elegeu (Lula em 2003). Apesar de que eu tenha certeza de que o povo brasileiro não mereceu a ditadura militar, o governo Collor (que quebrou tanta gente que trabalhava arduamente), o governo privatista do FHC, eles aconteceram e o Aécio (Never) não se apresenta sequer como uma versão melhorada deles. O PT é a esquerda que o Brasil consegue ser. Projetos importantíssimos para a mudança de uma estrutura social estão em andamento (o REUNI, a Bolsa Família, a reestruturação da polícia federal e sua independência, isto sem falar dos micro projetos, como o PIBID/CAPES, entre outros) e precisam ser mantidos. Quando um novo governo começa, sabemos que tudo entra em discussão e a eficácia ou o sucesso do Programa não significa exatamente o motivo pelo qual ele será mantido, ou seja, sucesso e popularidade pode ser justamente o motivo pelo qual ele será cortado ou suspenso, podendo, talvez mais tarde, até voltar com outro nome. A manutenção dos projetos que mostram-se eficazes em sacudir a estrutura social elitista do Brasil poderiam nos dar, quem sabe, no futuro, uma base eleitoral melhor informada, mais autônoma e que votasse segundo suas próprias convicções (e não tele guiadas).
PT foi o único o governo nacional que mexeu na estrutura de corrupção instalada no Brasil, quando deu independência, fez concursos e equipou a polícia federal, permitindo (por ter dado condições de trabalho - entre elas a independência), inclusive, que a corrupção envolvendo altos funcionários do próprio governo fosse identificada e corrigida. Não é razoável que este governo leve a pecha de "tão corrupto quanto...". A imensa dificuldade de comunicação precisa ser corrigida, a cultura de pouca análise, de pouca informação, de pouca discussão política também. Esquerda significa não concordar que o mundo está justo do jeito que está. No caso brasileiro ser de esquerda e votar no PT quer dizer que acreditamos na possibilidade de continuarmos nos construindo como um país "para si".
Pena que 12 anos depois da primeira eleição, as alianças continuam precisar abrigando tanta bos...bricolagem.

Olhe para Minas, "quem conhece Aécio, vota em Dilma". 

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